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Fui para o Tim Festival na cara e na coragem, com pouca grana e nada de credenciais, porque esse ano parece que o pessoal da organização pensou que nenhum piauiense iria querer saber deles. Ledo engano. Acompanhado de mais três conterrâneos e sabendo de outros vários espalhados, chegamos cedo ao local do show.
Por outro golpe da sorte, o dia 28 de outubro foi quente, espantando a chuva que era dada como certa. Os tipos, cada vez mais estranhos e interessantes, se aglomeravam perto do palco e eu ficava cada vez mais nervoso. Eu não acreditava. Dali a pouco, artistas que eu só via em clipes de You Tube ou de downloads de internet iam estar ali, há 20 metros de mim.
Mas daí já não tinha tempo. “This is Spank Rock, motherfuckers!” e lá estavam os americanos de Baltimore iniciando o festival. Misturando hip hop com eletro, a banda mostrou uma interação incrível com a platéia, fazendo um batidão, com percussionistas, DJ’s, simulações orgásticas e muita dança para o público.
Apesar de o show ter sido minúsculo, por volta de 45 minutos apenas, deu para esquentar e, ainda, foi nele em que tivemos os únicos moshs da noite: sendo quase jogados pelo resto da banda, três integrantes se entregaram aos braços da galera, arrancando gritos histéricos de todos.
A noite chegou e junto dela veio o Hot Chip. Os ingleses fizeram o show mais fraquinho da noite, mesmo com vários fãs cantando junto. Não se sabe se pelo aspecto inglês de ser, mas o certo é que eles praticamente não interagiram com a platéia, fazendo um show mais voltado para eles mesmos.
Ainda sofreram com uma parada de 18 minutos, por conta de problemas no som, que fizeram o ânimo ainda ficar mais instável. Mesmo assim, na hora de Over and Over, o maior hit do grupo, os pulos foram constantes, apesar de pontuais.
Ao fim, mais de 1h de espera. O clima mudava, as nuvens ficavam mais escuras, mesmo que a chuva não aparecesse. No palco, bandeiras eram hasteadas, telões eram colocados, além de uma pequena arquibancada. A espera parecia infinita, mas toda ela foi compensada.
Enfileiradas, diversas mulheres envoltas em roupas bufantes e instrumentos de orquestra, cada uma com uma bandeirinha nas costas, se aglomeravam na arquibancada que havia no palco. E elas abriam caminho para um ser pequeno, em um turbante enorme, que entrava ao som de Earth Intruders: Björk, a deusa do gelo, estava no palco.
Nada havia me preparado para aquilo. Tudo no show foi pensando tendo alguma razão de existir. Fosse a orquestra, a subversão na falta de guitarras e baixos, ou os dois capitães dos computadores, que sampleavam as músicas ao toque de dedos, em um equalizador high-tech, a sensação era de transe.
E, claro, existia Björk. Dançando freneticamente, pulando no palco, dizendo “obrigados”, a islandesa causava sensações impressionantes em seus fãs, que choravam, gritavam e mantinham os olhos fechados em forma de prece. Era quase uma celebração pagã, em que uma deusa vinda de um local distante mostrava aos seus adoradores que ela era sim misericordiosa e poderia fazer seus desejos serem atendidos: sem dúvida o show mais bonito que eu já havia visto.
Depois de mais uma hora para retirada dos apetrechos do show da Björk (atrasos foram constantes em toda a noite), um palco quase limpo de detalhes foi tomado por Juliette & The Licks. Depois de abrir com Smash Ang Grab, uma piradíssima Juliette Lewis perguntava aos fãs: “Do you really really Love the Licks?”. “Yeah”, responderam em uníssono, dando a deixa para que ela fizesse o que bem queria.
Isso inclui pulos frenéticos, simulações excitantes com o microfone, peitinho de fora para o baterista e uma super intimidade com a platéia. Músicas como Get Up e Hot Kiss ainda eram acompanhadas por todos, mostrando que atriz-cantora sabe mesmo agradar diversos públicos. Entretanto, a banda sofreu com um som abafado, que tirou muito da graça de ouvir a voz desesperada de Juliette, mas que foi compensando por ela própria.
Uma correria para próximo do palco tomou conta do público ao fim de Juliette. Eram os Arctic Monkeys que se preparavam para entrar e parece que todas as quase 30 mil pessoas que estavam no Anhembi queriam vê-los. Com uma decoração simples, como em uma garagem iluminada por holofotes, Alex Turner e companhia fizeram o show mais elétrico da noite.
Com todas as músicas acompanhadas pelos fãs, eles dosaram bem as escolhas do primeiro cd, Whatever People Say I Am, That's What I'm Not com as do segundo, Favourite Worst Nightmare. É incrível poder assistir um show de uma banda como Arctic Monkeys. Apesar da pouca idade, eles parecem estar em uma espécie de auge criativo, sendo extremamente intensos, como provaram na seqüência Fake Tales of San Francisco e I Bet You Look Good On The Dancefloor.
Mesmo pequeno e o pouco falatório com a platéia, os Macaquinhos do Ártico fizeram um show no ponto, que valeu a expectativa criada por ser hype internético.
Pés que doíam intensamente, uma fome desgraçada e tudo acabado nos bares do evento (só sobrou cerveja à cinco reais): antes do show do The Killers a sensação que tive é de que iria me desfazer em dor. Mas quando a decoração estilo old Las Vegas bíblico se iluminou e o vocalista Brandon Flowes chegou ao microfone, pedi aos deuses da música mais um pouco de força.
E valeu a pena. Mesmo com um atraso de três horas, a banda americana conseguiu fazer todo mundo perder mais um pouco da cabeça. Os hits estavam todos lá, como a enlouquecedora de platéias Somebody Told Me e Mr. Brightside, além de outras menos conhecidas, mas ainda assim ótimas da banda, como Jenny was a friend of mine, todas do primeiro cd, Hot Fuss, e o pop de Bones, do segundo trabalho, Sam’s Town.
Os Killers se despediram perto já das cinco da manhã, quando a enxurrada de gente começava a sair do Anhembi. Em casa, ainda excitado, me perguntava se tinha tudo sido verdade. Era sorte demais... Mas foi!