27 setembro 2007

[me conheço?]

Jamais vou esquecer os olhos lacrimosos da vovó quando eu anunciei que seria médico. Os eternos sonhos dela em ver netinhos de branco obtendo êxitos no Programa de Saúde da Família começavam em mim, abrindo as portas do exemplo de vida que seria meu curso ainda em concepção.

Mas eis que meus planos não passavam pela bata. Aliás, quando penso em toda a odisséia de escolhas que me levaram ao jornalismo, penso nas vezes em que vi o quanto o mais fácil nem sempre é o mais certo, mesmo que isso soe tão clichê.

Meu lance nunca foi sangue e pedaços de gente. Isso é muito cinematográfico e eu já havia visto o suficiente de Tarantino quando me dei conta que não sabia o que fazer da vida. E a verdade era essa. Eram tantas preocupações, já que a vida adolescente sem um exagero não se sustenta, que a própria idéia de saber o que eu queria para o resto dela me soava como desnecessária, mesmo sabendo o que eu não queria dela.

Um ano a mais de estudo, todos os cordados inertes novamente, professores amedrontando todos com os tridentes de outra desaprovação no vestibular e, de um estalo, tasquei a decisão: jornalismo.

Sem pompas, sem firulas, sem momentos de discussões com terapeutas vocacionais. Somente iluminação tardia, somado a um desespero maior que se instalava nos ânimos dos meus pais. De posse da vaga na universidade, se deram em mim os momentos de certeza, quando o caminho indicado se mostra o correto e você fica todo feliz com qualquer bobagem que dá certo.

Assim foi na primeira matéria que fiz, sobre a umbanda, que cheirava a leite de tão singela, já que eu ainda estava no primeiro período. Também o foi na primeira edição do famoso Calandragem, o jornal laboratório da Universidade Federal do Piauí.

E com minha voz no rádio, com meu rosto na televisão, com minhas sofridas (e, para não perder a rima, divertidas) desventuras de estagiário e, por fim, com uma monografia que vai me garantir um tema ainda para mestrado e doutorado.

O jornalismo não só me fez ser o que eu sou, resumindo em si a resposta à pergunta que originou esse texto. Ele chegou sem um porquê e agora, depois desses quatro anos, se mostra como certeza, mesmo que a explicação dessa certeza sempre esbarre na emoção de não saber explicá-la.

O fato é que sempre pensei na universidade como um filtro. Aqueles que possuem gostos parecidos se reúnem em nome de uma profissão a seguir. No meio do caminho ficam os que não se encontraram nas escolhas. Eu me encontrei nelas e nas pessoas que passaram. São as paixões mal resolvidas do Pedro Jansen. A determinação da Clarissa Poty. O medo de assumir o próprio talento do Edson Júnior. As incertezas da Sanmya Menezes. A inconstância do Marco Teles.

Todos jornalistas, todos meus amigos, todos decididos a, como eu, encontrarem uma resposta para dar a essa pergunta. Eu espero ter findado a procura: sou um jornalista, já decidi, com todas as incorreções que o termo permite.

Hoje, já tenho um primo médico, o que fez minha avó perder esse desejo tão intenso de me ver abrindo corpos. Na verdade, diferente do que eu imaginava, essa história de ela me ler todos os dias está fazendo com que acredite mais do que eu nessa minha decisão. Agora, toda pomposa, mostra os jornais às amigas e, cheia de certeza, diz: "Tá aqui meu jornalista da Veja". Agora, basta eu ajudar a fazer as predições da minha avó se tornarem reais.

11 comentários:

VALHA!!! disse...

Ei, é MeneSes! =P

tsc tsc...

J. disse...

vai entrar, mestre!

oseguinte disse...

é nesse mesmo conceito de filtro que me sustento hoje..e pensando mais adiante que a gente sonha,sem esquecer de pôr o pé no chão


:*

luana disse...

por incrivel q pareça eu tb me encontrei... fico passada td vez q penso nisso! :D
ps: se tu virar jornalista da veja eu deixo de falar com vc! rum

Lucy, disse...

Eu me lembro é da expressão de incrédula do meu professor de matemática, que nos ajudava nas escolhas e probabilidades de passar, quando eu disse que ia fazer jornalismo "Nega, com essa pontuação acho que vc não passa" e estranhamente eu não reagi tipicamente(me resumindo a minha insignificância e crises de Charlie Brown), eu tinha uma certeza estranha que era isso. Simplismente era...mas enfim, surtei total no comentário!

consigo te ver tão claramente nesse texto!:)


;**

O nome do blog é inspirado no filme "Bonequinha de Luxo" disse...

rpz.. se continuar assim, o céu é o limite pra você!!

=****

photographie disse...

a céu é linda!!!

Anônimo disse...

infelizmente, sou o caçula da familia, e só restou eu para ser o pioneiro em medicina :/
mas, perigão! nem que quisesse, não da mais haijaij..
eu passo!, a responsabilidade fica pro coitado que nascer primeiro dos netos =/

Anônimo disse...

que fantástico.
só espero que, um dia, eu (que sempre quis cinema) me encontre em letras - da mesma forma que você se encontrou em jornalismo.

Anônimo disse...

=~~


=~~~~~~~~~~~~~~



=~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~~

photographie disse...

adorei!